80 anos da bomba atômica: Na fase imperialista do capitalismo, o desenvolvimento das forças produtivas se voltam contra a humanidade

O tema da energia nuclear e das bombas nucleares voltou à discussão pública com toda força nos últimos meses. Isso porque os ataques dos EUA e Israel ao Irã tiveram como justificativa por parte dos agressores que o país persa estava construindo sua própria bomba atômica e seu programa nuclear deveria ser eliminado completamente. Isso quando os EUA e o Irã estavam em negociação sobre esse tema. Os EUA, ao lado da Rússia, são os maiores detentores de ogivas nucleares do mundo, foram os primeiros a testar e usar esse tipo de arma em uma guerra e, desde então, hipocritamente, são aqueles que, em última instância, controlam a produção e posse dessas armas por outros países. Em julho completou-se 80 anos dos primeiros testes feitos pelos EUA no deserto do Novo México (16 de julho de 1945). Nos dias 6 e 9 de agosto de 1945 o presidente dos Estados Unidos, Harry Truman, ordenou o lançamento de duas bombas atômicas, Little Boy e Fat Man, sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, matando mais de 200 mil pessoas, parte delas instantaneamente, outra parte ao longo daquele ano, por consequência dos graves ferimentos da explosão.

Atualmente existem aproximadamente 12 mil ogivas nucleares no mundo em posse de 9 países. Rússia e EUA com aproximadamente a mesma quantidade cada, somam em torno de 10 mil ogivas, seguidos pela China, com 600, França, 290, Reino Unido, 225, Índia, 180, Paquistão, 170, Israel, 90, embora esse número não seja confirmado oficialmente, e com pesquisas que apontam a capacidade em termos de matéria-prima para possuírem até 190 bombas e a Coréia do Norte, com estimativa entre 30 e 50 ogivas. Esse número total já foi bem maior durante a guerra fria, quando parte desses países possuíam dezenas de milhares de artefatos desse tipo. Mas para entender como se chegou a essa situação é preciso retomar ao menos o ano de 1933.

Do ponto de vista da física, foi em 1933 que se chegou a uma teoria mais acabada da utilização da energia nuclear, já investigada desde o final do século XIX. É útil perceber que se trata do mesmo ano em que os nazistas chegam ao poder na Alemanha e que a oposição de Esquerda Internacional rompia com a tarefa de resgatar a III Internacional estalinizada e passava a defender a construção da IV Internacional. Devido ao contexto social e político que já indicava a possibilidade de uma conflagração mais ampla, a pesquisa nuclear avançou rapidamente. O Reino Unido e a Alemanha estavam à frente desse desenvolvimento. Em um processo contraditório, o desenvolvimento das forças produtivas da humanidade, enclausuradas pela propriedade privada e pelas fronteiras nacionais, neste caso, serviram para a destruição massiva das próprias forças produtivas, no contexto da Segunda Guerra Mundial.

A ideia central da energia nuclear é simples, alguns átomos pesados, como o urânio 235, são instáveis e buscam a estabilidade se dividindo em átomos mais leves. Mas a soma das massas desses átomos leves não é igual à massa do urânio inicial. A diferença é a massa transformada em energia, tendo esse processo recebido o nome de fissão nuclear. Paralelamente às pesquisas sobre fissão nuclear, estava sendo desenvolvida a teoria da fusão nuclear, que implica a fusão de átomos leves, liberando grandes quantidades de energia (é o mesmo processo que acontece no Sol, por exemplo). Em 1952, os EUA testaram a primeira bomba de fusão (também chamadas de bomba H ou termonuclear), a Yve Mike, com 10,4 megatons, 500 vezes mais potente do que a bomba de Nagazaky. Nove anos depois, em outubro de 1961, a URSS testou a arma mais poderosa que a humanidade já viu, a “Tsar bomba”, com 50 megatons, 3300 vezes mais forte que a bomba que caiu sobre Hiroshima. Apenas para comparação, as alturas das nuvens em formato de cogumelo, que são características dessas bombas, atingiram 41 km no teste dos EUA e 65 km no teste da URSS, enquanto em Hiroshima foi de aproximadamente 16 km.

Em 1939 a Alemanha tentou comprar uma grande quantidade de urânio da Bélgica. Um grupo de cientistas tentou alertar a Bélgica, mas como eram exilados nos EUA e com pouca influência política não obtiveram sucesso. Buscaram então Albert Einstein para intermediar. Einstein, também exilado nos EUA, acreditava que seria necessário primeiro alertar o governo estadunidense da possibilidade da Alemanha construir sua bomba atômica. Escreve assim a sua famosa carta ao presidente dos EUA, Franklin Roosevelt. Curiosamente, foi o burguês Sacks quem levou a demanda até as altas cúpulas do governo americano. Em setembro de 1939 começou a Segunda Guerra Mundial, pouco tempo depois os EUA iniciaram o projeto Manhattan e em menos de 5 anos já tinham superado a Inglaterra e a Alemanhã (muito mais afetadas pela guerra) na construção da bomba, construiu-se um verdadeiro parque industrial para o enriquecimento de urânio (separação do urânio do minério), tratamento de plutônio e produção final.

Em julho, as primeiras vítimas da arma mais poderosa que o ser humano já construiu conheciam seu poder, moradores locais de Los Alamos, no Novo México. A Alemanha já estava derrotada, Adolf Hitler já estava morto, e o Japão já não oferecia qualquer resistência considerável. Depois de um ultimato, sem revelar a arma, na manhã do dia 6 de agosto de 1945, os EUA jogaram sobre a cidade de Hiroshima a primeira bomba atômica utilizada em um conflito. Três dias depois era a vez de Nagasaky, totalizando mais de 200 mil mortos nesses atentados. As bombas foram sobre o Japão, mas tinha o objetivo de colocar o mundo todo de joelhos, especialmente a URSS, que se tornaria a partir dali seu adversário principal. Terminava a Segunda Guerra para logo iniciar a Guerra Fria.

Fruto dessa capacidade militar, reflexo de sua capacidade econômica, os EUA foram estabelecendo sua hegemonia mundial. A criação da ONU, em outubro de 1945, serviu (e serve) aos interesses do imperialismo. A partir daí manejou a questão nuclear à sua maneira. Em 1953, o presidente dos EUA Eisenhower realizou na ONU um longo discurso intitulado Átomos pela paz, onde fomentou a criação de uma agência internacional de regulação da energia nuclear. A Agência Internacional de Energia Atômica – IAEA, foi criada logo depois, e novamente serviu ao imperialismo na regulação internacional da produção dessas armas. O palavreado sobre a contenção das armas nucleares acontecia simultaneamente aos testes com as bombas termonucleares no contexto da Guerra Fria.

Na década de 60, cinco potências eram dotadas de armas nucleares: EUA, Reino Unido, França, URSS e China. Estabelecia-se o conceito de “destruição mutuamente assegurada”, ou seja, a única forma de se proteger de um ataque nuclear seria também possuir bombas atômicas. A ONU elaborou um acordo para conter a proliferação dessas armas, o Tratado de Não Proliferação (TNP), que diz basicamente que qualquer país que tenha testado uma arma nuclear até 1967 pode manter seu arsenal, os demais não podem construir novas bombas. Estabelecia-se o monopólio das armas nucleares nas mãos do imperialismo e de alguns poucos países. Israel, Índia e Paquistão nunca assinaram o tratado e não podem ser vistoriados pela ONU. No final de 1950, com ajuda da França e dos EUA, Israel começou a construir suas bombas. A Índia, com a ajuda dos EUA e o Paquistão, com ajuda da China, iniciaram seus programas nucleares no mesmo período. Em 1981, no Iraque e em 2007, na Síria, Israel bombardeou instalações onde supostamente estariam sendo construídas armas nucleares. Em 2003, a Coréia do Norte abandona o TNP e em 2006, se torna o nono país com armamento nuclear. De passagem, mencionamos que o Brasil assinou o TNP em 1998, no governo FHC, se comprometendo, de acordo com as normas ditadas pelo imperialismo, de não criar um programa nuclear bélico.

O Irã fez parte do programa Átomos pela paz, recebendo inclusive um reator nuclear dos EUA em 1967 e assinou o TNP um ano depois. Em 2015 assinou um acordo com seis potências nucleares onde aceitava ser monitorado pela AIEA, que anos antes havia anunciado que o Irã havia realizado atividades no sentido da construção da bomba. Em troca, as potências retirariam uma série de sanções econômicas ao país. Trump, em seu primeiro mandato, abandonou unilateralmente esse acordo e retomou as sanções ao Irã. Em resposta, o Irã avançou no seu programa nuclear, sem, no entanto, chegar à construção da bomba.

É sobre esse contexto que vemos os EUA, proprietário de mais de cinco mil ogivas nucleares (de fissão e de fusão), tentar controlar a produção ou não das armas atômicas de outros países. No caso do Irã, uma flagrante interferência em sua já frágil soberania. Fica claro que as justificativas usadas nas recentes disputas em torno à questão nuclear ocultam razões submersas muito mais profundas. Entre elas está a tentativa de derrubar a república islâmica ampliando o controle regional sobre as imensas fontes de matéria-prima e rotas comerciais. O aprofundamento da crise mundial tem provocado uma escalada bélica mundial, além de uma retomada de programas nucleares por parte de países como a França, Reino Unido, Japão entre outros.

A fase imperialista do capitalismo implica na busca, por parte dos países ricos, de um maior controle sobre os recursos naturais, rotas comerciais e zonas de influência comercial, tudo isso sobre a base da propriedade privada dos meios de produção. As tendências bélicas e o armamento dos países respondem à crescente possibilidade de um conflito ampliado em um futuro próximo. As forças produtivas da humanidade, entre elas a ciência, neste contexto, se voltam contra a própria humanidade provocando a barbárie e a destruição. Persiste assim, a tarefa de encontrar um caminho emancipatório que liberte as forças produtivas da humanidade das atuais relações sociais de produção, o que implica em uma nova forma de produzir e viver.

Sobre o autor: Osvaldo de Souza é professor contratado do IFUSP, doutor em educação e mestre em Ensino de Ciências.

 

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